Chamo-me Manuel Francisco Domingos, tenho 30 anos de idade, dedico como responsável do Núcleo de Johrei da Canata, província de Benguela.
Minha reflexão
Eu tinha muita dificuldade de compreender os jovens da unidade e muitas vezes acabei gritando, me estressando com eles pela forma como encaravam a Obra Divina. Eles vinham a igreja com frequência, dedicavam comigo mas causavam-me muita dor de cabeça.
Passava dias a ensiná-los como desenvolver uma tarefa nas casas, nas ruas e quando terminava o encontro todos diziam no aprendizado:
– Pai, desta vez entendi, vou mudar, vou me esforçar.
Ficava muito feliz, distribuía as tarefas para o dia seguinte, mas ninguém aparecia ou melhor cada um chegava no horário que quisesse. Parecia que acordavam, se ligavam e um perguntava ao outro: “Como vamos arruinar o dia do responsável hoje?” Atormentavam-me. Certa vez, organizámos uma caravana, no dia da dedicação ficaram a brigar entre eles. Me afrontavam, não respeitavam os mais velhos na igreja, nem na rua.
Sinceramente, cheguei ao meu limite, comecei a impor disciplina a quem não desenvolve-se a tarefa como era orientado. Com isso, tornaram-se arrogantes e cínicos. Cheguei a proibir que fossem à igreja, mesmo assim iam. Podiam encontrar a fazerem limpeza na nave mas ficavam a conversar, os mais velhos é que faziam a programação dos cultos. Algo dentro de mim dizia para não desistir deles mas não sabia mais o que fazer.
Certo dia, o Ministro contou-me a experiência de uma membro que a filha levava as amigas bêbadas para casa, a senhora não sabia o que fazer naquele momento. Percebi que a dor e raiva que sentia era a mesma que os pais deles. Assim, tomei a decisão de me comunicar com os seus encarregados, fui ao altar, fiz um donativo de pedido de perdão e reafirmei o compromisso de ouvi-los e não só orientar e criar actividades.
Fui conhecer as escolas de 10 jovens a fim de falar com os professores, constatei que o comportamento e as notas eram péssimas, provavelmente seriam reprovados. Aquela situação me fez enxergar o nosso papel como orientadores.
Passo a relatar alguns casos que acompanhei:
- Um jovem muito tímido e isolado, filho de uma membro, não se comunicava com ninguém, estava sempre a ouvir música no auricular. Não dormia em casa e chamava a mãe de “Bruxa”. Conversando com a mãe, notei quanta raiva tinha do filho, e chamava-lhe nomes. Aprofundando na família, descobri que em casa haviam mais 4 jovens, também membros. Uma consumia álcool, a outra não dormia em casa e cada um cozinhava a sua comida. Todos brigavam entre si, as crianças a avó é que cuidava. O pai era tão calmo que os filhos podiam lutar em casa, mas não se incomodava. Perguntei-me: “Que tipo de pessoas são essas?” Como a casa tem Altar do Lar, no dia do culto do lar, decidi realizá-lo para perceber o que se passava. Para minha surpresa, estavam todos os filhos em casa. Aproveitando a oportunidade, pedi ao pai que lesse o Ensinamento “O Mau Comportamento dos Filhos é Consequência do Mau Comportamento dos Pais“, e fizemos a marcha de Johrei. Naquele dia houve um silêncio que os vizinhos admiraram.
No dia seguinte, o pai foi até a igreja falar comigo. Tive medo, porque falei que ele era culpado do mau comportamento dos seus filhos, mas ao contrário disse-me:
– Minha esposa é membro desta igreja há mais de 12 anos, mas nunca me interessei e nunca vim a igreja, apesar de reconhecer que curou da doença. Mas o comportamento dela agora que tem saúde piorou, só não abandono a casa porque já temos netos. Mas, muito obrigado por me ter mandado ler o ensinamento que fala que o mau comportamento dos filhos é culpa dos pais. Tive muitos problemas com os meus pais no Dombe Grande e sai de lá muito jovem para não ser Soba. Arranjei esta mulher, batia muito nela. Como tinha dinheiro, abandonava ela grávida e só voltava quando a criança tivesse 2 anos, engravidava novamente e ia embora. Foi sempre assim na gravidez dos 9 filhos que temos. Quando os vejo desviados, a lutarem entre si, corta o meu coração e fico sem forças para reagir. Culpava a mãe deles por não lhes ter educado bem, hoje sei a verdade.
Agradeci com ele e o tranquilizei dizendo que tudo foi necessário para o Plano de Deus, que se nos arrependermos de coração ainda há tempo de recomeçar.
No dia seguinte, o filho foi a nave, chamou-me de “Papa” e perguntou qual era a tarefa que ia desenvolver. Até então só me chamava de “Mais Velho”, fiquei muito surpreso com aquela atitude. Passou a cuidar da liturgia, limpa o altar, lê os ensinamentos, ministra Johrei e deixou de chamar “Bruxa” a sua mãe; as irmãs voltaram a frequentar, uma está a se empenhar no sanguetsu, e o pai ganhou a permissão de peregrinar no Culto às Almas dos Antepassados, na Sede Central.
- Uma jovem de 18 anos de idade, era totalmente calma, séria, vaidosa teimosa e muito cínica. Eu podia ficar o dia inteiro a lhe dirigir a palavra, mas não respondia. Ela podia sentar num lugar mais de 12 horas, adormecia na cadeira como se estivesse na cama, era surpreendente. Ao dialogar com o pai dela, ele só me dizia:
– Está bem, Papa. Está bem, Papa, vamos ver isso.
Percebi que o pai era outro teimoso e impaciente. Ela não fazia nenhum dever de casa, o irmão menor é quem limpava o chão, lavava a loiça, cozinhava, ela só comia e dormia. Ía à escola todos os dias, lia a matéria mas não assimilava. Na tentativa de procurar solução, ela me disse:
– Mas velho, minha mãe está muito mal.
Como ela vivia distante da mãe porque estava separada do pai, fui até o bairro da mãe, mesmo estando à beira da morte era antipática e ignorante, ministrei-lhe Johrei e fiquei horas a tentar saber o que sentia e como era o relacionamento com a família, mas não me respondia, só dizia:
– Esta tudo bem.
Então, pensei: Tenho que fazer algo para chamar a sua atenção. Levantei-me e lhe disse:
– Morre bem!
Olhou-me e disse:
– Acho que minha mãe é bruxa.
Perguntei porque que ela pensava aquilo. Ela respondeu:
– Porque me abandonou aqui doente, nem vem me cuidar e sonho com ela.
Então, perguntei:
– Há quanto tempo estás separada do pai dos teus filhos e quantas vezes foste visita-los? Olha, os teus filhos me disseram que a senhora também é bruxa.
Levantou-se da cama e começou a lamentar chorando e contou tudo.
Eu disse:
– Já chega, agora descansa.
Percebi que a sua infância foi traumatizada pelas constantes brigas dos pais, porque consumiam álcool por excesso, ela ficava com os irmãos menores durante dias e as vezes eram as vizinhas que davam de comer e banho, até que a madrasta que é membro lhes acolheu e passou a cuidar delas.
Assim pude mudar meu ponto de vista e me senti envergonhado, porque muitas vezes julguei e critiquei quando podia ajudar. Orientei de forma diferente desta vez, ganhei um forte abraço da jovem e começou a compreender a tarefa de ajudar em casa, já tem ido com frequência visitar a mãe e lavar a roupa dela, está se empenhando na dor das outras pessoas e na tarefa de expansão na casa dos frequentadores onde já encaminharam 14 frequentadores e 2 são confirmados a próxima outorga.
Estas actividades foram bastante úteis para união de todos os jovens e no trabalho em equipa. Fruto disto é o empenho que têm demonstrado na construção da nave, passámos a noite na obra a cuidar do material, mesmo ao ar livre ninguém reclamava.
Ganhamos a permissão de peregrinar no Culto às Almas dos nossos Antepassados, no qual 7 membros conseguiram encaminhar os seus companheiros;
Tivemos a permissão de receber 182 mil kwanzas de donativo para construção do futuro Johrei Center vindo de moradores que não frequentam a nossa igreja; Os moradores quando as flores em suas casas secam, vão a nave buscar; Temos realizado campanhas de limpeza no bairro com colaboração dos moradores.
Aprendi que não podemos escolher dedicar só com as pessoas que não aparentam defeitos e que não existe pessoa só possuidora de bem e nem só de mal, todos somos iguais aos olhos de Deus.
Comprometo-me a continuar aprofundando na dor das outras pessoas e solidificar a minha fé.
Agradeço a Deus, ao Messias Meishu-Sama, aos meus antepassados e a todos que têm me apoiado directa ou indirectamente.
Muito obrigado.