Todos sabem que as religiões apresentam aspectos daijo e shojo, especialmente no budismo; mas me parece que o assunto não foi devidamente aprofundado até nossos dias. Vou expor meu ponto de vista a esse respeito.
Em linhas gerais, daijo se refere à “Grande Natureza”. E Grande Natureza, logicamente, diz respeito ao nascimento e ao desenvolvimento de todas as coisas existentes. Portanto, daijo abrange tudo, nada escapa. Neste sentido, o daijo a que me refiro não é o daijo do budismo, mas sim, o caminho(8) daijo, que engloba a religião, a filosofia, a ciência, a política, a educação, a economia e a arte. Evidentemente, inclui também a guerra e a paz, o bem e o mal.
Ao observarmos o desenvolvimento de todas as coisas, notamos o caminho da Natureza. Logicamente, o valor de um verdadeiro ser humano reside no fato de ele ser capaz de reconhecer que, por meio da obediência ao caminho, tudo se desenvolve naturalmente. Por essa razão, quando há desvio do caminho, força-se a situação, o que acarreta, infalivelmente, obstáculos e, por conseguinte, estagnação ou ruína. Assim, a realidade do mundo nos mostra que, se estivermos em conformidade com o caminho, haverá construção; se nos desviarmos dele, haverá destruição. É exatamente como se passa com um trem: quando se encontra sobre os trilhos, avança; fora deles, não anda. Seguindo essa lógica, pode-se dizer que, em tudo, se algo desaparece é porque existe uma razão para tal. Da mesma forma, se algo nasce também há uma causa. O acaso não existe: tudo ocorre porque há um motivo.
Nesse sentido, quando uma ideologia tende para a esquerda, surge uma para a direita e vice-versa. Em qualquer situação, devemos seguir o caminho, sem pender para só um lado. É como dirigir um automóvel. Respeitando esse princípio, podemos dizer que o capitalismo, o socialismo, o comunismo, as alas conservadoras e as progressistas, o activismo e o passivismo, e demais “ismos” nascem por haver uma necessidade e, igualmente, desaparecerão quando não forem mais imprescindíveis. Evidentemente, as religiões também são assim: elas só surgem por haver uma razão para tal. Acontece que os seres humanos, em sua grande parte, presos ao próprio ponto de vista, acabam considerando uma heresia tudo o que difere de sua maneira de pensar. O provérbio “Tentar ver todo o céu através de um orifício no telhado” se refere a essa maneira de observar as coisas com a própria e estreita visão. No entanto, aos olhos de Deus, que governa a Terra, a pequenez do ser humano, que discute por coisas insignificantes, deve ser bastante decepcionante.
Neste mundo, tudo o que se torna dispensável para o ser humano sofre uma seleção natural. Entretanto, se uma coisa é necessária, por mais que o ser humano tente, não conseguirá eliminá-la. Suponhamos que surja uma nova religião ou ideologia. Mesmo que ela pareça supersticiosa ou errada aos olhos humanos, se for necessária à humanidade, progredirá; caso contrário, será eliminada. Assim sendo, até certo ponto, devemos deixar os acontecimentos seguir seu curso natural. Se for uma religião realmente atuante e de valor, a perseguição feita pelo ser humano até contribuirá para o seu crescimento. O maior exemplo disso é o cristianismo. Quem contestaria seu atual e próspero crescimento apesar de seu líder espiritual ter sido crucificado?
Escrevi este artigo para estimular o homem moderno a refletir sobre o erro de se ater à sua visão demasiadamente estreita e curta.
30 de janeiro de 1950
Alicerce do Paraíso vol.2 pág. 21
(8) Caminho daijo: Em japonês, “daijo-do”. Na cultura japonesa, “do” (caminho) é um sufixo muito utilizado no sentido de método, ensinamento, princípio, como por exemplo em “arte da ikebana” conhecida como kado (caminho das flores); “arte do chá”, conhecida como sado ou chado (caminho do chá) e, na arte marcial, “judô” (caminho suave).